quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

Tráfico Humano: Brasileiros caem na Armadilha e tornam-se Vítimas

 
 Imagem do meu acervo particular

A imagem acima é de um cartaz colado na Agência da Polícia Federal (Delegacia de Imigração), localizado no Aeroporto Santos Dumont (cidade do Rio de Janeiro). O cartaz alerta sobre os riscos de falsas promessas de emprego associadas ao tráfico humano.

Neste dia (19/12/2024), eu estava acompanhando o meu esposo, que havia renovado o seu passaporte. Ao ver o cartaz, solicitei autorização - ao funcionário da Polícia Federal - para tirar uma foto do mesmo, o que me foi autorizado. 

minha intenção era aproveitá-la para trabalhar o tema (tráfico humano) – um dia – no Blog, já que por falta de fotografias minhas (próprias), eu sempre sou forçada a capturar imagens na Internet, em outros sites, para ilustração. 

E o momento mais que exato chegou! Digo, infelizmente chegou! 

Pois, o tráfico humano é uma prática ilegal e lucrativa, que atinge milhares de pessoas no mundo inteiro. Sendo, sem dúvida nenhuma, uma das formas mais grave de violação dos direitos humanos. E não haveria de ser diferente em relação ao Brasil, isto é, para os brasileiros.  

E o momento chegou com a notícia de que dois brasileiros foram vítimas do tráfico humano por uma máfia chinesa. Os paulistas Luckas Viana dos Santos (31 anos) e Phelipe de Moura Ferreira (26 anos), chegaram ao Brasil na 4ª feira passada (19/02), após terem sido mantidos reféns, por três meses, por uma máfia de golpes cibernéticos em Mianmar, no Sudeste Asiático. 

Da esquerda para direita, Luckas Viana e Phelipe Ferreira
Imagem capturada na Internet (e modificada)
Fonte: O Globo
Foto: Guilherme Queiroz

No ano passado (2024), ambos, que até então não se conheciam, foram vítimas do golpe das falsas promessas de emprego na Internet, tal como o cartaz (no início deste artigo) chama a atenção (alerta).

Luckas Viana recebeu uma proposta de emprego nas Filipinas, para trabalhar em um cassino. Meses depois, o cassino fechou e ele, como não tinha dinheiro para voltar ao Brasil, procurou outras oportunidades de emprego pela região asiática.

Por meio do Telegram, ele recebeu um convite para trabalhar na área da tecnologia em Mae Sot, cidade tailandesa situada na fronteira com Mianmar. A viagem foi realizada no dia 7 de outubro, mas, Luckas acabou sendo levado por mafiosos para KK Park, em Mianmar, onde passou a ser escravizado.

Phelipe foi feito refém no mês de novembro do mesmo ano (2024). Inicialmente, ele recebeu um convite de emprego no Uruguai e, lá mesmo, em terras uruguaias, ele teve, através do Telegram, outra proposta de trabalho na área tecnológica, só que na Tailândia.

De acordo com o mesmo, ao chegar no país, um motorista o pegou no hotel e o levou para Mianmar, onde ele se tornou refém como os outros imigrantes, incluindo o Luckas, que já se encontrava na localidade e não conhecia o Phelipe.

Com as falsas promessas de emprego, todos foram parar na KK Park, localizada em um Complexo de fábricas fraudulentas em Myawaddy (Mianmar), na fronteira Mianmar-Tailândia. Esse complexo é conhecido por aplicar golpes financeiros on line.


Complexo Industrial onde se localiza a KKK Park
Imagem capturada na Internet
Fonte: G1
Foto: Stefan Czimmek/DW

Phelipe só soube da existência de Luckas, três dias após chegar na fábrica, mas, não o conheceu pessoalmente. Ele só soube que outro brasileiro (Luckas) estava preso por não querer trabalhar e atender as ordens da máfia chinesa.

Em seu depoimento, Luckas afirmou que se negou a aplicar alguns golpes e, em razão de sua resistência, ele foi punido com golpes desferidos com vara de bambu, choques elétricos, chegou a ficar pendurado e algemado por horas.

Já o Phelipe preferiu não se arriscar a contrariar as ordens da máfia. Ele tinha que se passar por agente digital para aplicar golpes on-line, sobretudo, em brasileiros (mesma nacionalidade).

De acordo com o mesmo, havia uma meta a ser alcançada e que aumentava dia após dia. Se a meta não fosse cumprida, eles eram punidos.

De acordo com o Phelipe (G1), a rotina de trabalho (escravo) na KK Park seguia o seguinte esquema:   

"Nesse script, a gente perguntava ao cliente,

no primeiro dia, informações como nome, idade, país

onde morava, se era solteiro, casado, viúvo,

com o que trabalhava e o salário.

Já no quarto dia, a gente pedia uma ajuda.

Falava que trabalhava numa plataforma online

chamada Wish e, se ele ajudasse,

ganharia uma comissão de 30 dólares."


No outro dia, a vítima do golpe tornava a pedir ajuda. Nesta fase, ela ganhava a comissão, só que tinha que concluir algumas tarefas na Plataforma e, para isso, precisava fazer recargas.

E é, justamente, neste momento, que as vítimas passam a perder dinheiro para a máfia. A primeira recarga era no valor de US$150 (150 dólares), a segunda, US$ 500, e assim, por diante, até completar o valor de U$D 5.000,00 (cinco mil dólares). 

Em média, Phelipe e outros imigrantes trabalhavam 16 horas por dia, aplicando golpes financeiros nas pessoas. De acordo com o mesmo,

 

"Às vezes, a gente trabalhava 22 horas por dia.

Líderes de equipe, todos chineses,

nos monitoravam a cada 10 minutos.

Se não cumprisse aquela meta, no final do mês,

eu ia receber a punição. 

A punição era eletrochoque,

espancamento ou squat down, 

que é fazer agachamento. Recebi punição três vezes."


Nos três meses em que “trabalhou” na KK Park, Phelipe foi punido - apenas - com agachamentos, não sofrendo eletrochoque e nem espancamento, segundo o mesmo. 

Tanto Phelipe quanto Luckas, juntamente com outros reféns, planejaram fugir por três vezes, mas, só obtiveram sucesso na terceira tentativa

A primeira tentativa ficou acertada para ser no dia 1º de janeiro de 2025, mas, não deu certo. A data do segundo plano ficou definido para ser em 28 de janeiro (dia do Ano Novo chinês), mas, por conta das comemorações da data festiva, a quantidade de policiais era muito grande. De acordo com Phelipe, eram mais de 500 guardas no rio. Por isso, também, não tiveram sucesso. 

Eles, em tempo algum, pensaram em desistir e, por isso, marcaram a terceira data de fuga: dia 08/02.

O plano de fuga não foi descoberto pela máfia e a operação foi viabilizada com a ajuda de ativistas da ONG internacional "The Exodus Road" - que luta contra o tráfico humano - que conseguiu avisar os parentes das vítimas e à imprensa brasileira.  

Eles foram resgatados no dia seguinte (09/02), com a ajuda da ONG "The Exodus Road". No entanto, logo após a fuga, eles foram apanhados e levados para um local específico.  

Segundo Phelipe,

"O meu antigo chefe entrou no quarto

 com o meu antigo líder e espancou a gente.

Nesse momento, eu já não tinha mais esperança.

Mas, depois de um dia lá, 

a tribo Karen entrou e resgatou a gente.

Nesse momento, chorei tanto, mas tanto."

 

A tribo Karen, que ele citou como responsável pela libertação do grupo, trata-se - na verdade – dos soldados do Exército Democrático Karen Budista (DKBA), que foi imprescindível para o resgate de todos os reféns escravizados, após negociamento com a ONG Exodus Road. Em seguida, eles foram levados a um centro de detenção local.

Soldados do Exército Democrático Budista dos Karen
Imagem capturada na Internet
Fonte: Al 102


Três dias depoiseles foram encaminhados para outro centro de detenção, em Mae Sot (Tailândia), onde foram submetidos a procedimentos, com a Embaixada brasileira, para confirmar que eles eram realmente vítimas de tráfico humano. 

No dia 18 de fevereiro (3ª feira), à tarde, eles embarcaram de Bangkok (Tailândia) e, no dia seguinte (19/02) desembarcaram no Aeroporto Internacional de Guarulhos, na Grande São Paulo, onde houve o reencontro deles com suas respectivas famílias. 

Luckas e Philipe com seus familiares
Aeroporto de Congonhas (São Paulo)
Imagem capturada na Internet
Fonte: Metrópoles

Cíntia Meireles, Coordenadora da ONG Internacional Exodus Road, que acompanhou o caso dos paulistas Phelipe e Luckas, inclusive, participando do reencontro deles com suas respectivas famílias, no aeroporto de Guarulhos, informou que há outros oito brasileiros mantidos como reféns e trabalhando para a mesma máfia de golpes financeiros.

  Ela disse:  

"Acho que devolver um filho para uma mãe,

um filho para um pai, não tem preço.

Fazer esse reencontro e cumpri a missão é muito bom.

A gente tem uma base na Tailândia e nosso objetivo é

libertar o máximo de pessoas e fazer trabalho de prevenção

para que não tenha mais vítima de tráfico de pessoas."

 

Eles tiveram muita sorte em sobreviver como vítimas de tráfico humano, ter tido o apoio e a ajuda de pessoas na hora da fuga e do resgate de ambos. No final, aprenderam uma lição fundamental para não cair mais em armadilhas deste tipo...

"Vim para cá com um sonho, que foi destruído.

O alerta que tenho para dar é sempre procurar

saber mais sobre a empresa que você vai trabalhar

e se é realmente legalizada"

(Philipe Ferreira, G1/Globo)

 

Fontes:
 

. BAYER, Julia; PINEDA, Julett; LI, Yuchen e SANDERS, Lewis: Por dentro da fábrica de fraudes que explorava brasileiros - DW 

. Como um exército rebelde budista ajudou a resgatar os brasileiros escravizados por máfia de golpes cibernéticos – Al 102 

. MARCUS, Enzo: “Finalmente, livres”: vítimas de tráfico humano no retorno de Mianmar - Metrópoles

. Nações fracas da ASEAN 'correm o risco de evoluir para estados fraudulentos' - Asiafinancial 

. PATRIARCA, Paola: Brasileiros vítimas de tráfico humano em Mianmar chegam ao Brasil – G1/Globo

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