Retomando o assunto sobre os movimentos de terra (deslizamentos) que ocorreram em nosso estado em razão das chuvas, desde dezembro de 2009, gostaria de falar duas coisas.
Uma delas é lembrar – antes de tudo – a campanha de arrecadação de donativos para os desabrigados de Angra dos Reis, da Baixada Fluminense ou de Magé continua. Existem vários postos de arrecadação, espalhados pela cidade (Rio de Janeiro) e em outros municípios do estado.
Eu mesma já encaminhei algumas roupas, lençóis, fronhas e colcha para o Posto de Arrecadação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), no Maracanã.
Seria bom que cada um fizesse a sua parte, pois é muito triste e desolador ver que as pessoas perderam tudo, depois de tantos anos de sacrifícios e de trabalho.
É evidente que as perdas materiais não chegam ao mesmo nível das perdas humanas, mas é duro ter que recomeçar, quando este recomeço demanda muitos recursos financeiros.
Outra coisa que gostaria de comentar é sobre todas estas discussões acerca de remanejamento das comunidades situadas em áreas de riscos (morros e nas várzeas de rios).
Estas ocupações representam problemas antigos, as quais nunca foram tratados a contendo por nenhum governante. Qualquer um, leigo ou não, tem alguma noção sobre os perigos e riscos que representam as construções e/ou atividades econômicas desenvolvidas nestas áreas.
Quando falo em atividades econômicas, vale lembrar as imagens de Saquarema – postadas neste espaço – em agosto de 2008, onde é bastante visível os diferentes níveis dos processos erosivos nas encostas – desde uma simples ravina até uma grande voçoroca – por conta do pisoteio do gado agregado às precipitações pluviais.
Formação e desenvolvimento de Ravinas e outros processos erosivos - Serra do Mato Grosso - Saquarema (RJ) - Imagem do meu acervo particular
Voçoroca - Serra do Mato Grosso - Saquarema (RJ)
Por outro lado, a expansão imobiliária e, ao mesmo tempo, a falta de moradia para as comunidades mais carentes impõe e expõe uma situação crítica em termos de uso e apropriação do solo se estendendo para áreas desocupadas, sejam estas próximas de rios ou nas encostas.
Depois de uma tragédia, com número de vítimas fatais elevado e toda uma exposição nas mídias, nacional e internacional, falar de uma política de solo, de um programa de remanejamento das comunidades parece uma iniciativa louvável por parte do governo.
Na verdade, o louvável seria a prevenção; seria não deixar a situação chegar ao nível que chegou.
Depois de muitos anos sem ir à Paquetá, quando eu fui com o meu marido e a minha filha, em 2005, eu percebi – ainda – estando na barca, que haviam sido construídas diversas casas em um dos morros da ilha.
Fiquei pasma, pois o cartão postal configurado nas belezas naturais da ilha de Paquetá já estava definitivamente marcado pela má administração pública de seu espaço urbano.
Depois, soube que outras comunidades também foram sendo instaladas na ilha.
A todo momento, surgem e crescem construções em áreas de riscos. Só não vê quem não quer enxergar o problema em si e o quê este representa em termos de segurança à vida humana, à manutenção da moradia e dos problemas ambientais gerados à partir da iniciativa e da ocupação.
As construções próximas ou nas várzeas dos rios sofrem diretamente com as enchentes provocadas pela conjunção dos seguintes fatores: grande quantidade de lixo lançados e acumulados no leito dos rios, assoreamento dos mesmos e os altos índices pluviométricos (chuvas).
Nas encostas, os efeitos das águas pluviais são agravados em razão da declividade do terreno e da instabilidade do solo. A existência de uma cobertura vegetal é capaz de reduzir o efeito do escoamento superficial, mas não impossibilita o movimento de massa, visto como se deu na enseada do Bananal, na Ilha Grande, após mais de dois dias de chuvas contínuas.
Não podemos esquecer que devido às condições climáticas da zona tropical ou intertropical (a mais quente e úmida do planeta), na qual a maior parte do nosso território se encontra localizado, favorecem a ação do intemperismo químico, provocando a decomposição da rocha através da presença de minerais mais susceptíveis ao ação da água.
Processo bastante comum em países, cujas condições climáticas se caracterizam por grande quantidade de chuvas, o que se observa nos cortes de estradas ou nas encostas, na maior parte de nosso território, não é a rocha fresca ou nua, como os geólogos ou geomorfólogos a denominam. O que vemos é considerado por alguns dos ramos citados como “lixo”, ou seja, o material decomposto, em geral, argiloso e/ou siltoso, de coloração amarelo a marrom-avermelhado.
E em razão de ser um material decomposto, inconsolidado, este se configura de fácil remoção, principalmente, por agentes de erosão, como a água correntes dos rios ou das chuvas.
Além disso, a grande exposição ao Sol e as altas temperaturas fazem com que haja ressecamento do solo, bem como das fendas existentes neste. Estas condições também favorecem o desmoronamento.
Av. Presidente Kennedy - Bairro Pilar - Duque de Caxias (RJ)
Av. Presidente Kennedy - Bairro Pilar - Duque de Caxias (RJ)
Imagem do meu acervo particular
Vale lembrar que, o material inconsolidado pode ser o elúvio, ou seja, o manto de intemperismo propriamente dito (a rocha alterada in situ ou manto de alteração da rocha) ou um colúvio, material também inconsolidado, que sofreu transporte por algum agente erosivo e foi depositado posteriormente, já bastante alterado em sua composição interna devido a introdução de novos materiais durante o percurso.
De tudo isso fica uma lição: não podemos ignorar as características físico-químicas dos solos, até mesmo aqueles com cobertura vegetal, a declividade, as condições climáticas regionais e, muito menos, as várzeas dos rios.
Principalmente, em termos de ocupação humana (moradia), cortes de estradas ou desenvolvimento de atividades econômicas, onde se verificam condições favoráveis ao desenvolvimento de erosão ou movimentos de massa, bem como de enchentes nas áreas próximas dos rios.
A conjunção de todos estes fatores impõe uma dinâmica ambiental susceptível a novos impactos e, indubitavelmente, a tragédias, tais como vimos na Baixada Fluminense e em Angra dos Reis, só para citar estes dois exemplos.
Mas é sabido que o mesmo justifica as enchentes em São Paulo, em Santa Catarina e outras localidades, espalhadas, em nosso país. Os governantes sabem disso, mas pouco é feito em termos de prevenção.
O governador do Rio de Janeiro falou de uma política de solo, mas em pequeno período de tempo não é possível remover comunidades e mais comunidades, que – durante anos – vêm ocupando e se apropriando de terrenos em áreas de riscos. E, muito menos, resolver de vez a questão do déficit de moradia. E isso não se restringe apenas à esfera municipal ou estadual.
De acordo com a ONG Contas Abertas, o governo federal gastou dez vezes mais com reparos - em consequência de desastres naturais - do que com a prevenção (ambientebrasil).
O professor da Universidade de Brasília (UnB) e doutor em Ciência Política, Evilásio Salvador foi incisivo nesta questão e ressaltou a responsabilidade dos gestores públicos pela sucessão de desastres naturais, tal como ocorreu em Angra do Reis, pela falta de um plano habitacional sério de médio e longo prazo, que seja capaz de resolver o problema de ocupação nas áreas de riscos, como as encostas (ambientebrasil).
Outro dia, eu assisti um debate na TV sobre estas questões, ligadas à prevenção, e um dos debatedores (infelizmente não lembro todos os nomes e nem o dia) disse que a verba sai mais rápido após ocorrer uma tragédia do que – no caso – de ser um projeto ou programa de prevenção.
Todo ano, as “coisas” acontecem, se repetem... na mesma época (verão). Há perdas materiais e humanas. O que falta mais acontecer para que os nossos governantes se conscientizem que “prevenir é melhor que remediar”?
muito bom o artigo.me ajudou muito.
ResponderExcluirParabéns.
Obrigada, Diego Henrique! Fico feliz por poder contribuir de alguma forma. Abraços
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