segunda-feira, 8 de abril de 2019

Torres (RS): Uma Aula Prática de Geologia

 
 Vista da Praia da Guarita tirada do alto da Torre do Meio (das Furnas)
Imagem do meu acervo particular
Fotografia de 1991

Falo tanto em sala de aula, mas nunca publiquei nada a respeito e nem mesmo as fotos que tirei, as quais foram digitalizadas, pois – na época (início da década de 90) – as máquinas não eram digitais (nem sei se já haviam no mercado brasileiro e, pelo menos, a minha não era).

Estou me referindo à paisagem costeira de Torres, município localizado no litoral norte do Rio Grande do Sul, delimitado pelo rio Mampituba, que faz a divisa entre o estado e o de Santa Catarina. Ao pesquisar sobre o mesmo, descobri que o seu nome “Mampituba” significa, em tupi, “rio de muitas curvas”.

Observando a imagem abaixo, capturada do Google Map, fica fácil de compreender a razão do seu nome na língua tupi.
 
 
  

  Foz do rio Mampituba
Imagem capturada na Internet
Fonte: Prefeitura de Torres

 
Apesar do litoral gaúcho apresentar esse forte potencial turístico, em seus 623 Km de extensão, inclusive, sendo considerado o estado com o maior sistema de praias arenosas do mundo, as peculiaridades da paisagem litorânea do município de Torres lhe imputam, além deste, um grande potencial científico e educacional.


 
 
 Imagem capturada na Internet
Fonte: FEPAM 
 

 
Eu tive a oportunidade de conhecer Torres, quando estudei (Mestrado/Especialização) na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E, diferentemente da costa aplainada, arenosa, que predomina na faixa costeira sul-rio-grandense, em Torres são encontrados acidentes geográficos como morros e penhascos, sob a forma de falésias, que representam testemunhos de eventos geológico-geomorfológicos, ocorridos há milhões de anos e moldados ao longo do tempo.
 
A ocorrência de tais promontórios a beira mar, em Torres, confere à localidade uma verdadeira aula prática de Geologia e de Geografia Física (paleoambientes), sob o contexto da Bacia do Paraná (maior bacia sedimentar do Brasil).

Porém, essas importantes singularidades de sua paisagem passam desapercebidas pela maior parte dos turistas.

Esses “morros” receberam a denominação de torres, o que deu origem também ao nome do município. A formação deles está relacionada ao extravasamento do magma (derrames de lavas basálticas).

Os três maiores foram denominados de Torre do Farol (ou do Norte), Torre do Meio (ou das Furnas) e a Torre de Fora (ou do Sul). Além desses há o chamado “Agulha da Guarita” (na praia de mesmo nome), o Morro das Pedras (mais afastado, localizado em um campo de dunas) e a Ilha dos Lobos (localizada a 1.800 m da praia, que é um refúgio de lobos e leões marinhos).

 

 Imagens do meu acervo particular (1991)
(Fotografias digitalizadas)
 
Torre do Meio ou das Furnas
 

Vista da Praia da Cal
entre a Torre do Norte (do Farol)
 e a Torre do Meio (ou das Furnas)
 
 Torre de Fora (ou do Sul)
 
 
Sem pretender me aprofundar sobre os aspectos geológicos da região, tendo em vista, o público-alvo deste espaço (alunos do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio), vou tentar sintetizar a geologia da região a partir das respectivas formações rochosas antigas, cujos registros assinalam, em ordem cronológica, a Formação Botucatu (ou arenito eólico/paleodeserto) e a Formação Serra Geral (derrame basáltico), que fazem parte da evolução da Bacia do Paraná 
 
A Bacia do Paraná é uma enorme depressão, que sofreu a deposição de sedimentos de ambientes variados (marinho, fluvial, lacustre, desértico, entre outros), com idades variando do período Ordoviciano (Era Paleozoica) ao período Cretáceo (final da Era Mesozoica), sendo capeado pelo basalto da Formação Serra Geral. Os processos erosivos também foram e são atuantes em sua superfície.

Com cerca de 1,4 milhão de km², ela é uma das maiores bacias sedimentares do Brasil (1,1 milhão de km²), ocupando também parte do território da Argentina (100 mil de km²), Paraguai (100 mil de km²) e Uruguai (100 mil de km²).


Imagem capturada na Internet
e modificada no Adobe Photoshop


Com um formato alongado, na direção Norte-Nordeste a Sul-Sudoeste, esta apresenta, aproximadamente, 1.750 km de comprimento e uma largura média de 900 km.

Sua evolução durou mais de 350 milhões de anos, passando por grandes ciclos geológicos, os quais possibilitaram a formação de rochas de diversas origens (marinha, lacustre, fluvial, glacial, entre outros), que constituem a sequência sedimentar mais antiga,  datada da Era Paleozoica.

Na Era Mesozoica, a partir do final do período Triássico e durante quase todo o Jurássico, a extensa área da Bacia do Paraná foi coberta por campos de dunas, transformando-se em um imenso deserto (Formação Botucatu).  

No final desta mesma Era geológica, durante o período Cretáceo, teve início a grande ruptura do supercontinente Gondwana com a separação das placas tectônicas Sul-americana e a Africana, a partir das correntes de convecção do magma. Com os derrames vulcânicos, houve a separação da América do Sul e da África, assim como houve a formação do Oceano Atlântico Sul, cujos processos vulcânicos cobriram a Bacia do Paraná. Este é considerado o maior derrame basáltico da superfície seca da Terra.

“As lavas vulcânicas basálticas caracterizam-sepor ter baixa viscosidade.
Com isso o vulcanismo não é explosivo,
nem forma cones vulcânicos como no vulcanismo
de erupção central.
É um vulcanismo de fissura, que forma geoclases,
grandes fendas na crosta por onde a lava ascende
e espalha-se sem violência.”
(BRANCO, Pércio de Moraes, 1996)
 
 
Pois bem, é justamente na praia da Guarita, mais especificamente, na Agulha da Guarita que é possível observar o contato entre o arenito eólico do paleodeserto (Formação Botucatu) e o derrame basáltico (Formação Serra Geral).

Segundo RODBE, o arenito (Formação Botucatu) foi cozido pelo calor do derrame basáltico e, em consequência disso, ele ficou “bem mais resistente do que o basalto à abrasão do mar. Ê a isso que se deve a forma piramidal da Guarita”.



Praia da Guarita
Imagem capturada na Internet
Fonte: Apure Guria - Foto de Fernando de Castilhos
 
  Contato entre a Formação Botucatu (arenito eólico)
e a Formação Serra Geral (basalto)
Imagem manipulada no Adobe Photoshop
 
A nível de curiosidade...

1. A Torre do Meio, também conhecida por Morro das Furnas, recebe esse nome (Furnas) em decorrência haver várias grutas.

Todas as imagens, abaixo, são do meu acervo particular (fotos tiradas em 1991)






 
 
 
 2. A  decomposição do basalto da Bacia do Paraná deu origem a um dos solos mais férteis do Brasil, o latossolo roxo, mais conhecido como “terra roxa”. Solo bastante aproveitado até hoje, para a agricultura, sobretudo, durante o Ciclo do Café.

3. Outra curiosidade que envolve, também, o estado do Rio Grande do Sul e as rochas da Formação Serra Geral diz respeito à ocorrência de um mineral de cor roxa, a ametista.  A maior jazida de ametista do mundo está localizada no norte do estado, na cidade de Ametista do Sul (daí o nome do município sul rio-grandense), a qual tem o título de Capital Mundial da Ametista




Ametistas
Imagem do meu acervo particular



Fontes de Pesquisa

. BRANCO, Pércio de Moraes. A Evolução Geológica da Região de Torres. Raízes de Torres – Edições EST 1996 - Prefeitura Municipal de Torres. Disponível em PDF
 
. BRANCO, Pércio de Moraes. Geologia nas Praias de Torres (RS) Blog Percio M. Branco
 
. FARION, Sônia Rejane Lemos. Litoral do Rio Grande do Sul: Rio, Lago, Lagoa, Laguna. Ágora, Santa Cruz do Sul, v. 13, n. 1, p. 167-186, jan./jun. 2007. Disponível em PDF
 
. LEINZ, Viktor. Contribuição à Geologia dos Derrames Basálticos do Sul do Brasil. Geologia 5, Universidade de São Paulo (USP) – São Paulo, 1949. Disponível em:
http://www.revistas.usp.br/bffcluspgeologia/article/view/121703/118596

. ROHDE, Geraldo Mário. A Origem Geológica das Formações de Torres – RS – Disponível em PDF

. Torres e os lindos paredões à beira mar – Blog ApureGuria

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