Sábado passado, 17 de julho, comemorou-se o Dia de Proteção às Florestas e, também, por conseguinte, o Dia do Curupira, personagem do folclore brasileiro, de origem indígena, considerado o protetor das florestas.
No entanto, mediante às práticas ilegais e registros históricos, nem mesmo um exército de curupiras seria capaz de proteger as nossas florestas dos incessantes desmatamentos, das queimadas, dos avanços do agronegócio, da erosão, entre outras ações antrópicas de fortes impactos ambientais, negativos.
Na verdade, há uma combinação de fatores naturais (sazonais) e antrópicos que resultam na chamada “temporada das queimadas”.
O inverno, estação do
ano em vigência, apresenta condições mais secas, o que favorece a prática das
queimadas. Por sua vez, a vegetação seca,
nesta época do ano, se torna um material combustível
(combustível vegetal) que facilita a sua
queima.
Segundo CHANDLER et al. (1983 apud WHITE et al. 2014),
“o material combustível florestal constitui todo e qualquer tipo de matéria orgânica, viva ou morta, encontrada no ambiente, capaz de entrar em combustão e queimar, sendo que sua quantidade pode variar de centenas de quilos a dezenas de toneladas por hectare, dependendo do tipo, espaçamento e idade da vegetação.”
Como vem ocorrendo ao longo dos anos, além do Cerrado e da Floresta Amazônica, o Pantanal também já vem sofrendo com as queimadas há meses, tendendo a situação a se agravar, nos respectivos biomas brasileiros, neste período onde a umidade é menor.
Embora, as queimadas e os incêndios florestais ocorram em todo
território nacional, os três biomas – acima citados – são os mais afetados pelo
fogo, apresentando os maiores números de casos.
De acordo com a matéria “vegetação
como combustível”, apresentada em Pdf pela Ulisboa, os componentes
de um complexo de combustível vegetal se apresentam conforme os seus estratos horizontais, a partir das diferenças
de comportamento potencial do fogo relacionadas em cada um deles, da seguinte
forma:
. Combustível de Solo: “inclui as camadas de húmus e fermentação do solo orgânico. O topo desta camada é onde a folhada começa a decompor-se e a base é no solo mineral. É material bastante compactado, que tipicamente arde lentamente, sem chama.”
. Combustível de Superfície: “é o estrato através do qual mais frequentemente se propaga o fogo. Inclui árvores em pé até 2m, arbustos, ervas, folhada e material lenhoso caído.”
. Combustível Aéreo ou de Copas: “inclui as árvores e arbustos com altura acima de 2m. Mesmo quando não ardem, as copas influenciam o comportamento do fogo, por exemplo, afetando a velocidade do vento à superfície.”
Como eu mesma avisei aos meus alunos, nestes meses de inverno, que se estende de 21 de junho a 22 de setembro, as notícias não serão nada positivas acerca desta prática, intensificando-se em agosto e setembro, colocando em risco eminentes a flora, a fauna e a população que vive em suas proximidades e que acaba sendo forçada a se deslocar para outras áreas.
Os efeitos das queimadas e dos incêndios florestais já foram sentidos, antes mesmos da estação de inverno chegar.
No pantanal sul-mato-grossense, por exemplo, na última edição do Globo Rural, exibido em 18 de julho (domingo passado), Corumbá, importante município do estado (MS), foi apontado como líder do ranking das cidades com maior número de focos de incêndio. Segundo o referido programa, de janeiro até o presente mês, foram contabilizados 500 focos.
Dados já previstos no início do mês vigente, quando o mesmo fora
apontado - de acordo com o Sistema de
Monitoramento de Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)
- como o município brasileiro com maior foco de queimadas no país (na época,
com 322 notificações).
Desde 1998, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) vem monitorando as queimadas em todo território nacional, especialmente, em nossos biomas.
Segundo o Globo Rural, as queimadas no Pantanal já atingiram cerca de 60 mil hectares, o que equivale a 600 km².
Como a maioria das queimadas se encontra associada diretamente ao desmatamento, havendo um aumento desta prática ilegal (desflorestação ou desflorestamento ou desmatamento), a preocupação com a elevação dos focos de queimadas no país é procedente.
E esta é outra preocupação dos especialistas e ambientalistas acerca da Amazônia, pois só neste mês de junho foram registrados 926 km² de áreas desmatadas na região.
Segundo os dados de desmatamento apresentados pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON),
no período de agosto de 2020 a junho deste ano,
a Amazônia perdeu uma área de 8.381 km²
(equivalente a 45 Maracanãs).
O monitoramento realizado - pelo referido Instituto (IMAZON) - é feito por meio de análise de imagens de satélite e de radar. De acordo com o levantamento obtido para o mês de junho, os estados do Pará e do Amazonas lideram o ranking de desmatamento na região, sendo responsáveis por 69% de toda a área devastada, o que equivale a 568 km².
Vale ressaltar aqui, que este cenário de devastação não só da floresta Amazônica, mas de todos os biomas do país se encontra fundamentado na política antiambiental do Governo Federal, que vai na contramão da conservação do meio ambiente, apoiando os grandes latifundiários, os lucros do agronegócio, da exploração mineral, entre outros, além de tirar o poder de diligência dos Institutos de fiscalização.
Não há preocupação com a conservação dos nossos recursos naturais, dos nossos biomas, assim como com as populações indígenas e outras que vivem e sobrevivem diretamente com a exploração autossustentável de suas respectivas biodiversidades.
Sem essa permissividade legal
por parte do governo, as características
naturais do inverno (estação seca) e a ocorrência
de combustível vegetal em grande quantidade poderiam até desencadear
o fogo, a queima, mas – sem dúvida alguma - com menos intensidade e recordes de
focos ilegais que o país registra anualmente.
O terceiro elemento, considerado o principal e o pior neste cenário, tem o aval do governo, inclusive, em termos de redução ou anulação de multas ambientais em relação a sua prática criminosa. Conforme enfatiza Marcio Astrini, Secretário-Executivo do Observatório do Clima, em reportagem no G1 –Amazônia:
“ (...) o fogo na Amazônia só ocorre quando
há uma junção de três fatores:
tempo
seco (comum nesta época do ano),
material combustível no chão (com árvores cortadas,
fruto do aumento do desmatamento),
e
criminosos para atear o fogo.”
E completa, afirmando:
“Esses
criminosos estão trabalhando mais do que nunca
porque o
governo diminuiu a fiscalização de campo
e os
deixou muito à vontade pra praticar seus crimes”.
(G1, op. cit.)
No final de junho deste ano, o então Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pediu exoneração do seu cargo, pois temia ser preso após denúncia de sua participação em um esquema de extração e venda ilegal de madeira. Além disso, ele também foi acusado de dificultar as ações de órgãos ambientais, como o IBAMA, por exemplo, tal como já mencionei, aqui, neste espaço.
No ano passado, eu publiquei uma série de artigos a respeito das queimadas e dos incêndios florestais no país, bem como do jogo de interesses econômicos e políticos envolvidos, as consequências diretas e indiretas, devastadoras (mortes, riscos de extinção, deslocamentos forçados da população etc.).
Para o seu lugar, o presidente Jair Bolsonaro nomeou Joaquim Álvaro Pereira Leite, que exercia a função de Secretário da Amazônia e Serviços Ambientais no próprio Ministério.
Mas, a sua escolha também não é vista como promissora aos princípios reais desta Pasta, isto é, em defesa da conservação do meio ambiente ou, de pelo menos, ser mais nesta linha do que em outra, pois o mesmo desempenhou a função de Conselheiro da Sociedade Rural Brasileira (SRB), por mais de duas décadas, ou seja, trabalhou em uma Organização ligada aos interesses do setor agropecuário.
Assim sendo, nada vai mudar!
Continuaremos a ver o Brasil em chamas, a morte a ameaçar os animais feridos até os levar ao fim, clareiras abertas nas florestas, seguindo como um ritual, o desmate e logo depois a queima. Moradores migrando em razão do fogo que arde, quase ou em suas portas, ao mesmo tempo em que veem a legislação falha a trapacear o direito à vida, enquanto as autoridades e os governantes apoiam a devastação da natureza de forma discreta, acreditando que o povo não vê e não percebe.
Como publiquei, neste espaço, no ano passado...
Todo ano é a mesma coisa...
Fontes de Consulta
. A Vegetação como Combustível - Ulisboa
. Bombeiros projetam recorde de atendimentos em queimadas em 2021 e pedem consciência à população – Diário de Goiás
. Em junho, Amazônia perdeu o equivalente a quase três vezes a área de Fortaleza - Estadão
. MOREIRA, Mariana. Seca coloca Corumbá como líder em focos de incêndio - Correio do Estado
. Queimadas na Amazônia Legal sobem 49% em maio na comparação com o mesmo mês de 2020, aponta Inpe – G1/Amazônia
. VILELA, Pedro Rafael. Ricardo Salles pede demissão do Ministério do Meio Ambiente – Agência Brasil
. WHITE, Benjamin Leonardo Alves et. al. Caracterização do material combustível superficial no Parque Nacional Serra de Itabaiana - Sergipe, Brasil - Ciênc. Florest. 24 (3) • Set 2014
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