sábado, 4 de fevereiro de 2023

A Memória da Escravidão na Região Portuária da Cidade do Rio de Janeiro - Parte I

 
Ladeira próxima ao Largo 
de S. Francisco da Prainha
Imagem do meu acervo particular

Aproveitando e dando continuidade ao contexto da publicação anterior, acerca do Observatório do Valongo, não restam dúvidas quanto a sua importância histórica, científica e acadêmica no campo da Astronomia 

Ademais há outros aspectos relevantes de sua localidade (Morro da Conceição) e adjacências no contexto da história brasileira e carioca, os quais merecem ser abordadas:  

(...) o Morro da Conceição faz parte da história,

não só da cidade, como do Brasil também.

Foi na região, entre o Centro e a Zona Portuária,

que começou a ocupação da cidade

do Rio de Janeiro.

(BARBOSA, 2021)  

O Morro da Conceição ganhou maior projeção com e após as obras de revitalização da Zona Portuária da cidade. Trata-se de um recorte espacial do período colonial do Brasil, encravado na cidade do Rio de Janeiro, que conserva particularidades da época, capazes de nos transportar ao passado através de seu conjunto arquitetônico caracterizado por ruas estreitas, becos e ladeiras, com pavimentação de blocos de paralelepípedos, alguns até de pé-de-moleque. E, especialmente, por seus casarios antigos, de influência da arquitetura lusitana (Séculos XVIII e XIX). De acordo com as fontes de pesquisa, muitos dos seus atuais moradores são descendentes de imigrantes portugueses, que por lá se mudaram e se fixaram.  

Sendo assim, no Morro da Conceição, além do Observatório do Valongo, outras unidades históricas se destacam, a saber:  

- Palácio Episcopal (ou Palácio da Conceição): inicialmente era a Capela de Nossa Senhora da Conceição, que foi ampliada e transformada em residência oficial dos bispos da diocese da cidade (de 1702 a 1905). Após a este período, o prédio foi adquirido pelo Ministério da Guerra, passando a sediar o Serviço Geográfico do Exército e, também, o Centro de Operações Cartográficas da 5ª Divisão de Levantamento do Exército Brasileiro. Atualmente abriga o Museu Cartográfico.

Imagem capturada na Internet
Fonte: 
Viajando na história do Rio de Janeiro

- Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição: mais conhecida como Fortaleza da Conceição, esta foi construída nos fundos do Palácio Episcopal, em 1718. No entanto, ela jamais serviu para este intento, isto é, ser uma unidade de proteção contra investidas estrangeiras em caso de ameaça e/ou enfrentamento direto.  

A fim de ser evitado possíveis conflitos com as autoridades eclesiásticas, alojadas no Palácio Episcopal, no caso dos estampidos dos canhões, todo o seu material bélico foi retirado do local. Afinal, na ordem de chegada, os bispos haviam sido os primeiros.  

O máximo que a Fortaleza serviu foi como fábrica de armas, prisão política e quartel. Inclusive, há registro do confinamento - na masmorra - do ativista político, escritor e poeta português Tomás Antônio Gonzaga por ter participado da Inconfidência Mineira (motivo de sua captura e prisão). Depois, este foi banido para Moçambique, onde veio a falecer em 1810, aos 66 anos.  

Imagem capturada na Internet
Fonte: 
Viajando na história do Rio de Janeiro


. Ruas e Ladeiras Históricas: diversas ruas e ladeiras são famosas e integram o rol da programação turística do Morro da Conceição, não só pelo fato de serem as mais antigas da cidade, como por outros aspectos peculiares. E, entre suas ruas e ladeiras mais conhecidas e visitadas estão a rua do Escorrega, a Ladeira do João Homem, a rua do Jogo da Bola e a rua Eduardo Jansen.  

Devo ressaltar aqui, que eu não cheguei a conhecer todas, pessoalmente. Daí eu extrair informações de diversas fontes de minha pesquisa na Internet.  

De acordo com os dados obtidos, a rua do Escorrega - bastante inclinada - era mais conhecida como “Ladeira do Quebra-Bunda” em consequência dos vários tombos provocados em mulheres, sobretudo, as que usavam calçados de salto alto.  

Na Ladeira do João Homem, o destaque se dá para uma casa rosa, de três andares, bastante estreita, medindo apenas 2,4 metros de largura.  

 Já a rua do Jogo da Bola é onde se encontra a pequena igreja de Nossa Senhora da Conceição. Mas, o que é mais curioso é o seu nome...  

Com relação à origem deste, duas teses existem: uma alega que este se deu em razão das correntes com bolas de ferro que os escravos, presos, traziam aos seus pés, as quais eles “brincavam” de chutar. 

A segunda, por sua vez, afirma que o nome surgiu em razão de outro jogo, o jogo de bocha, cuja versão atual é praticada com bolas pequenas e pesadas, jogadas com a mão e, não com os pés.  

Embora, outros sites também confirmem estas duas versões, eu – particularmente – considero ambas um tanto devaneadoras, tendo em vista que, primeiro, o peso da bola de ferro presa nos grilhões (correntes),  utilizados para impedir a fuga dos escravos, além de dificultar a mobilidade dos mesmos, não deveria permitir tais atividades de divertimento. 

Quanto à versão de sua origem ligada ao Jogo de Bocha, segundo FRAZÃO (2022), este chegou ao nosso país através dos imigrantes italianos, que se destinaram para o Rio Grande do Sul, no início do século XX. Segundo o mesmo há indícios que esta modalidade de jogo tenha sua surgido na Grécia e Egito antigo, antes de chegar à Itália.

Contudo, BARBOSA (2006) confirma a segunda tese acerca de sua origem estar ligada ao Jogo de bocha: 

“Uma das poucas e principais ruas do Morro da Conceição,

a Rua do Jogo da Bola (este poético nome da rua 

permanece desde os tempos da colônia 

onde, de fato, havia um jogo da bocha)

é uma rua pequena e estreita, 

onde só passa um carro de cada vez,

o que amplia ainda mais, a meu ver,

a vocação para a civilidade e urbanidade do lugar (...)


Contrapondo-se a ambas correntes, MELO (2016), ao analisar – em seu artigo -  o caráter de entretenimento do jogo da bola presente no Rio de Janeiro e. sobretudo, as mudanças nos padrões de sociabilidade e diversão na segunda metade do Século XVIII e XIX, afirma: 

“A modalidade que, no Rio de Janeiro, chegou, vinda da Península Ibérica, conhecida como jogo da bola de pau, guardava semelhanças com o boliche. Uma pelota de madeira era atirada, por uma pista de terra ou tábua, para derrubar pinos que tinham diferentes pontuações. Em muitas ocasiões, havia ao redor estabelecimentos de vendas de bebidas e comidas (botequins, tabernas, armazéns, casas de pasto). Era comum a existência de apostas entre os jogadores e entre o público. ” 

Como se pode observar, por sua descrição, o referido jogo se assemelha mais a uma versão primária do boliche. O referido autor se reporta a outro tipo de jogo, também de origem lusitana, porém menos difundido, mas similar ao bocha, chamado Laranjinha

Já a rua Eduardo Jansen tem notoriedade por ter, no final do logradouro, uma escadaria de acesso à parte alta do morro, mas o seu sucesso se dá porque os seus degraus foram pintados com a bandeira do Brasil. Com isso, o círculo azul, central, da mesma, que representa o céu do nosso país, se tornou o ponto preferencial para foto.  

No sopé e nas proximidades do Morro da Conceição, mas sob o mesmo contexto histórico acerca do período da escravidão no Brasil, podemos ainda visitar o Largo de São Francisco da Prainha, a Pedra do Sal (antiga Pedra da Prainha), o Cais do Valongo e os Jardins Suspensos

Só que estes ficarão para a próxima postagem.


Fontes de Consulta

. AZEVEDO, Rafael Luís: Jogo da Bola: a rua mais simpática do país (2016) - Verminosos por Futebol 

. BARBOSA, Antônio Agenor: Morro da Conceição: a Geografia da Cordialidade (2006) - Vitruvius 

. BARBOSA, Maiara: Morro da Conceição: conheça uma comunidade diferente no Rio de Janeiro (2021) – Meu Destino É Logo Ali 

. CHAGAS, Viktor: Rua do Jogo da Bola - Rio de Janeiro, RJ (2007) - Overmundo 

. FRAZÃO, Gustavo: Bocha – Conheça Tudo Sobre essa Modalidade (2022) – Clube PaineirasMorumby 

. MEINICKE, Thaís: Dez motivos para visitar o Morro da Conceição (2017) – VejaRio 

. MELO, Victor Andrade de: Mudanças nos Padrões de Sociabilidade e Diversão: O jogo da bola no Rio de Janeiro (séculos XVIII e XIX) – 2016 – História/Scielo (em PDF) 

. PIMENTEL, Márcia: O pitoresco e histórico Morro da Conceição (2015) - MultiRio 

. RICCO, Daniele: Morro da Conceição - A História Presente em suas Ladeiras (2021) - Viajando na história do Rio de Janeiro

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