Cidade de Derna Imagem capturada na Internet Fonte: Vatican News Foto: The Press Office of Libyan Prime Minister/AFP |
Outro tópico referente a desastres naturais que marcou muito o mês passado (setembro) aconteceu na Líbia, país localizado no Norte da África, o qual sofreu uma forte tempestade, na região leste do país, no dia 10 de setembro.
Cidades afetadas pela Tempestade Daniel Imagem capturada na Internet Fonte: BBC News Brasil |
As chuvas extremas, consideradas dentro de um sistema de tempestades denominado de “Tempestade Daniel”, atingiram e inundaram países como a Grécia, a Turquia e a Bulgária, matando mais de 20 pessoas.
Ao alcançar partes do Mediterrâneo Central e Oriental, esta se transformou em um “medicane”, ou seja, um ciclone tropical mediterrâneo. Trata-se de um tipo de tempestade relativamente rara, cujas características se assemelham às dos furacões e tufões.
Imagem capturada na Internet Fonte: Tempo Agora |
Em território líbio, as inundações - causadas pela tempestade
Daniel - foram devastadoras,
sobretudo, na cidade portuária de Derna, na porção Leste do país, tendo em vista
o rompimento
de duas barragens do rio Wadi Derna.
Essas barragens eram antigas e não passavam por manutenção desde 2002,
apresentando – com isso – um alto potencial de risco de rompimento e de inundação.
Com o rompimento das barragens, um grande volume de água desceu pelas montanhas em direção à zona costeira, atingindo a respectiva cidade, inundando e destruindo bairros inteiros, tal como um tsunami. De acordo com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), a onda foi de 7 metros.
Rompimento das barragens e o trajeto das águas Imagem capturada na Internet Fonte: G1/Globo |
Embora, divergentes quanto aos números oficiais de vítimas
fatais, fornecidos pelo ministro da Saúde do governo líbio, os dados do Crescente
Vermelho Líbio (FIRC) assinalam que a tragédia em Derna provocou a morte de
cerca de 11,3 mil pessoas, sendo estimado 10,1 mil desaparecidos. Enquanto,
em outras cidades
do Leste da Líbia, pelo menos 170 pessoas morreram em consequência das enchentes.
Antes de atingir o território líbio, o sistema medicane foi fortalecido com a evaporação das águas do Mar Mediterrâneo, que se encontravam - excepcionalmente - quentes.
Especialistas afirmam que a atmosfera estando mais quente,
ela retém
mais umidade, o que implica em chuvas mais extremas. Daí o aumento da
intensidade
de fenômenos meteorológicos extremos estar associado, provavelmente,
à crise
climática da Terra.
Mas, neste caso da tragédia na Líbia, devemos considerar não só a tempestade de caráter raro (extrema) e as mudanças climáticas, como também o rompimento das duas barragens (velhas) do rio Wadi Derna.
Em Derna choveu 250 mm, mas o recorde
ficou para Al-Bayda, cidade localizada a oeste da primeira, cujo
registro foi de mais de 414 mm em 24 horas.
Além desses fatores, o país é marcado por uma grande instabilidade
política, dividida em dois governos sob duas faixas territoriais internas (faixas
Oeste e Leste), o que agrava mais ainda o cenário caótico da Líbia
pós-tragédia (chuvas torrenciais e inundações).
Detentora das maiores reservas de petróleo e de gás natural da África,
o país foi dividido entre grupos adversários após a queda do ex-Líder Muammar Khadafi,
que governou o país – por 42 anos - de forma autocrática (ditatorial). Ele foi deposto e morto
durante o movimento
chamado “Primavera
Árabe”, em 2011, que tinha o apoio das potências
ocidentais. Processo este, que levou a uma guerra civil na Líbia (2014-2020), agravando o
cenário de
devastação do país, causando amplos prejuízos à pouca infraestrutura básica
que possuía, na época.
Ex-ditador da Líbia, Muamar Kadafi Imagem capturada na Internet Fonte: Veja |
Em 2020 foi assinado um cessar-fogo por ambos os lados, no entanto, as disputas políticas continuaram.
Em 2021 foi constituído um Governo de Unidade Nacional, na faixa Oeste, com sede na capital Trípoli, cujo governo foi reconhecido internacionalmente (ONU). No ano seguinte, o Parlamento do Leste compôs um governo concorrente, denominado de Governo de Estabilidade Nacional, sob a cidade portuária de Tobruk.
Ambos se autoproclamaram governantes legítimos da Líbia, o que acarreta – até hoje - grandes dificuldades quanto aos esforços internacionais de paz. A princípio, mesmo sob pressão internacional e, mediante às disputas e conflitos violentos internos, pouca ou nenhuma perspectiva de solução mitigadora à sua unificação existe.
Sob este contexto de instabilidade política e, no caso da recente tragédia ocorrida no país, essa polarização de dois governos dificultou os esforços de resgate, uma vez que ambos não conseguiram responder com a devida agilidade à catástrofe natural, ocorrida justamente na porção Leste do país.
Melhor dizendo... Com a tempestade Daniel, os serviços públicos do país colapsaram. O fato de não ter tido, por anos, investimentos em obras públicas de grande relevância à evacuação e deslocamento da população e, sobretudo, em sistemas efetivos (comunicação, equipamentos apropriados e recursos humanos treinados) quanto à prevenção a desastres naturais e/ou de origem antrópica, fez com a situação do país se agravasse mais ainda, causando um elevado número de desaparecidos e de vítimas fatais, muitas das quais carregadas para o mar.
Muitos corpos se encontravam espalhados pelas ruas e/ou nas praias. O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) enviou sacos para os corpos das vítimas mediante às dificuldades da Líbia. E, mais, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e outros grupos de ajuda humanitária solicitaram às autoridades líbias que parassem de enterrar os corpos das vítimas em valas comuns.
Segundo Petteri Taalas, Secretário-Geral da Organização Meteorológica
Mundial (OMM):
“Se houvesse um serviço meteorológico
operando normalmente,
eles teriam emitido os avisos
e também a gestão de emergência deste
teria
sido capaz de realizar a evacuação das pessoas
e
teríamos evitado a maioria das vítimas humanas”.
(CNN Brasil, 2023)
Imagem capturada na Internet
Fonte: Organização Meteorológica Mundial
Imagem capturada na Internet
Fonte: CNN Brasil
“As condições meteorológicas não foram bem estudadas,
nem os níveis da água do
mar e das chuvas,
nem as velocidades do
vento.
Famílias que poderiam
estar no caminho
da tempestade e nos vales
não foram retiradas a tempo.
A Líbia não estava preparada
para uma catástrofe como esta.
Nunca testemunhamos esse
nível de catástrofe antes.”
(OSAMA ALY,
chefe da
autoridade de Emergência e Ambulâncias da Líbia)
Fontes de Consulta
. ALKHADI, Celine e HAQDA, Sana Noor (2023): Maioria das
mortes causadas por tempestade na Líbia poderia ter sido evitada, diz ONU – CNN Brasil
. Autoridades da Líbia abrem inquérito para investigar colapso de duas represas durante tempestade (2023) – Jornal Nacional
. CARDOSO, Derla: Como o caos político da Líbia agravou a
tragédia das enchentes (2023) – CNN Brasil
. Catástrofe Épica pela Chuva na Líbia pode ter mais de 10 mil mortos (2023) - Metsul
. Chuva extrema na Líbia se tornou até 50 vezes mais provável (2023) – Tempo Agora
. Enchente catastrófica na Líbia ocorreu em 90 minutos, dizem autoridades (2023) – CNN Brasil
. Enchentes na Líbia: a cidade que parece ter sido varrida por tsunami (2023) – G1/Globo
. Enchentes na Líbia podem ter deixado mais de 20 mil corpos: ‘O mar continua trazendo corpos” (2023) – G1/Globo
. Justiça da Líbia ordena detenção oito funcionários do governo após inundações (2023) – G1/Globo
. Líbia: quatro perguntas e respostas sobre a situação após as enchentes (2023) – Médicos Sem Fronteiras
. Mortes na Líbia sobem para 11,3 mil, diz Crescente Vermelho (2023) - G1/Globo
. 'Parece o apocalipse': enchentes na Líbia podem causar mais de 20 mil mortes (2023) – BBC NewsBrasil
. Tempestade Daniel deixa rastro de morte e destruição na Líbia (2023) – Vatican News
. Tempestade Daniel provoca chuvas extremas e inundações no Mediterrâneo, pesadas perdas de vidas na Líbia (2023) – Organização Meteorológica Mundial
. VIGGIANO, Giuliana, PUTINI, Júlia e BISCHOFF, Wesley : Rompimento
de duas barragens agravou situação na Líbia; MAPA mostra percurso da água
(2023) – G1/Globo
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